FIV e preconceito

Dia 31 foi dia de consulta e picas no Centro de Saúde.
Os manecos estão ótimos! O D. com 6.350kg e B. com 5.750kg. Quem diria! O que nasceu mais pequenino já vai com 600g de avanço! Estão muito reguilas e muito bem desenvolvidos. Tomaram a rotarix e as outras duas do Plano Nacional de Vacinação. Portaram-se lindamente durante toda a consulta até levarem as picas nas perninhas. O D. chorou uns 30 segundos e depois calou-se com colinho e miminho. Já a B. chorou muito. Chorou descontroladamente e até tremia 😭 Parte-me o coração vê-los chorar assim 😢 💔 E logo ela que quase nunca chora. Tão sensível que é a minha princesinha.
Mas o objetivo deste post é outro.
O nosso médico de família e a nossa enfermeira estavam de férias e por isso fomos atendidos por outra médica e outra enfermeira. Ao contrário do nosso MF, que é um castiço e uma jóia de pessoa mas como médico deixa muito a desejar, esta jovem médica pareceu-me muito atenta. Pela primeira vez tiveram uma consulta como deve ser no CS. Já o nosso, é só para conversar sobre tainadas e falar sobre a família. Como sabe que são acompanhados por um médico pediatra desleixa-se.
A enfermeira que nos atendeu, já nos tinha atendido uma vez. É simpática e às vezes até é engraçada, tipo pateta, mas também é um bocado... como hei de dizer isto? Um bocado limitada, de mente pequena, ignorante, desinformada e preconceituosa.
Durante a consulta, a médica jovem e a enfermeira pateta estavam encantadas com os meus manecos. “Que duas coisinhas tão fofas”, “que queridos”, “um loirinho e uma moreninha”, “que encanto”, diziam. Babei-me, claro!
Dra. novinha - “Tem gémeos na família?”
Eu - “Não. Fizemos fertilização in vitro.”
Dra. novinha - “Ah ok. Então correu mesmo bem, um casalinho!”
E é aqui que começa o show.
Enf. Pateta - “Eu já sabia. Vê-se logo. Mal os vi tirei-lhes logo a pinta!”, disse a enfermeira pateta com um arzinho sabichão.
Dra. Novinha - “Sabias como??”
Enf. Pateta - “Porque são muito diferentes um do outro. Não sabias?? Então ficas a saber! Hás de reparar que os gémeos de fertilização são sempre muito diferentes um do outro. Quando são gémeos naturais são muito parecidos, às vezes até são iguais.”
Eu - “Quê?? Isso não tem nada a ver!”. Ignorou-me...
Dra. novinha - “Ahh?? Que estás para aí a dizer? O que é que uma coisa tem a ver com a outra?? Olha que até conheço alguns gémeos e são todos muito diferentes.”, respondeu com um ar pasmado.
Enf. Pateta - “Hmmm olha que não. Olha que eu vejo muitos gémeos de fertilização feitos no CHAA que a Dra. S. manda cá e são todos assim. Já os naturais são sempre parecidos.”, insistiu.

Eu fiquei a olhar para uma e para outra, a assistir àquele conversa idiota. “Gémeos de fertilização” e “gémeos naturais”, disse ela. Será que a enfermeira pateta pensa que “gémeos naturais” são sempre monozigóticos? Será que ela não sabe que numa gravidez gemelar espontânea também existem gémeos dizigóticos? Os chamados “gémeos falsos”? Será que ela não sabe que independente de ser espontâneo ou através de fiv, os gémeos dizigóticos são originados por dois óvulos e dois espermatozóides? E daí poderem ser muito diferentes? 🤔  🤷‍♀️
Mas isto não ficou por aqui.

Enf. Pateta - “Ai, estou encantada com estes bebés! Que riquezas! Você deve andar radiante!”
Eu - “Sim, claro que ando!”, respondi a sorrir. A enfermeira pateta continuava com elogios. “Olha-me só os olhinhos dele! Azuis! Quem têm na família com olhos azuis?”, perguntou.
“Várias pessoas... a minha mãe e o meu avô. Do lado do meu marido, tem o meu cunhado. E o avô paterno tem olhos verdes.”
Enf. Pateta - “Ah pois... e olha só o tom de pele dela! Que bronze! Parece que já foi à praia. Que inveja! Olhe que ela é parecida consigo. Passa bem por sua filha.”
Quê??? Terei entendido bem??
Eu - “Mas ela é minha filha.”
Enf. Pateta - “Sim mas parece mesmo normal. Tipo, ninguém vai perceber que é de FIV se não disser.”
Eu - “Mas ela é normal!”, já não me estava a agradar a conversa. “E eu digo a muita gente que fiz FIV sem problema nenhum.”
Enf. Pateta - “A sério?? Diz?? Ai eu não dizia!”
Eu - “Porque não hei de dizer? Não é nenhum crime! Digo sem problema nenhum e eles também vão saber, claro.”
Enf. Pateta - “A sério? Eu acho que não dizia. Sabe que há pessoas muito preconceituosas!”
Really? 😒
Dra. Novinha - “Porque não há de dizer se não tem mal nenhum? Hoje em dia é algo tão vulgar e banal!”
Enf. Pateta - “Ai mas sabes que na escola as crianças também são muito mázinhas! Depois fazem bullying. Vou-lhe contar uma coisa. Não sei se sabe mas já se fazem fertilizações há muitos anos. E quando eu andava na escola havia um menino que foi feito assim e os outros souberam. A mim diziam-me que eu tinha sido cagada por uma mosca por ter sardas e a esse menino chamavam-lhe Extraterrestre.”
Eu e a Dra. novinha desatamos a rir! 😂😂 No meio de tanta idiotice, até deu para rir!
Eu - “Pois mas isso foi há muitos anos atrás. Quando estes foram para a escola, às tantas um terço dos colegas foram gerados por FIV. Hoje em dia já é algo corriqueiro. Mas sim, existe muito preconceito por aí, em muita coisa! Se existe! Mas não é por isso que tenho que esconder. Está na hora de falar disto mais abertamente e de forma natural.”

Pelos vistos a enfermeira pateta acha que as pessoas devem omitir que conceberam os filhos por FIV. Ok, é uma opinião. Não tem mal nenhum um casal não querer contar. Como também não tem mal nenhum contar. Mas também acha que filhos por FIV não são tão filhos como os que são concebidos de forma espontânea. E também acha que filhos concebidos por FIV são menos parecidos com os pais do que os concebidos de forma espontânea. E também acha que sabe distinguir os gémeos concebidos por FIV dos gémeos concebidos espontaneamente... será que ela também sabe distinguir uma criança concebida por FIV de uma criança concebida espontaneamente quando não tem irmãos gémeos? E já agora, será que também consegue perceber se a criança foi concebida na cama, no sofá ou em cima da mesa de jantar? Dentro de casa ou ao ar livre? 🤔

Nossa! Quanta ignorância! Quanto preconceito! 🤦‍♀️
Mas este episódio no CS deixou-me a pensar... quantas enfermeiras patetas haverão por aí? Da mesma forma que ela (profissional de saúde) pensa assim, muitas outras pessoas também pensam, infelizmente. Como vejo isto de forma tão natural, até me esqueço que muitas pessoas veem isto como algo estranho, anormal e até como motivo de vergonha! Triste... Em 2018 ainda há quem pense desta maneira tão paleolítica!